Lélio Coluccini e a arte nos estádios: Guarani x Ponte Preta, derby empatado!

Lélio Coluccini’s sculptures in the Campinas soccer stadiums: Guarani X Ponte Preta, the derby is draw!

Gilberto Gatti – jornalista, pesquisador. Sócio correspondente em Brasília, DF, e Fernando Antonio Abrahão – historiador, pesquisador. Titular da Cadeira 11 do IHGG Campinas.

A presença de obras de artes decorando os estádios de futebol é comum hoje em dia. Os grandes espaços, a elitização da assistência e o marketing de fidelização permitem o investimento em artes plásticas de grande valor. Afinal, essas obras podem repercutir nos torcedores os sentimentos de alegria, de pertencimento e de orgulho, resultando no bem-estar dos consumidores da partida de futebol e dos demais produtos que o clube dispõe e oferece.

Historicamente, a função social da arte e o esporte ou a arte e o futebol, como trata especificamente este artigo, conecta-se com o feito épico, o personagem lendário, o marco, a conquista. Mas a arte de encomenda é arte? Se você duvidar disso, terá de eliminar do seu rol de artistas e de obras de tirar o fôlego o que foi produzido durante o império romano ou o Iluminismo europeu, para darmos apenas esses exemplos onde escultores famosos e os anônimos produziram estátuas, hermas e pinturas de pessoas e feitos, consideradas clássicas.

Se a arte é uma representação, é comum procurar a quem melhor distingue uma representação artística de um registro histórico para elaborar aquilo que se quer eternizar, justamente o personagem ou a conquista.

Recentemente, em janeiro de 2019, o AFC Ajax da Holanda homenageou seu grande futebolista, Johan Cruyff. Meses antes, a torcida do Clube de Amsterdam se mobilizou e arrecadou o valor necessário para contratar o escultor que melhor reproduzisse as feições do filho da faxineira do Clube que se tornou um dos renomados jogadores do futebol mundial. Com pompas, a inauguração do busto de Cruyff foi feita em local de amplo trânsito e visibilidade da Arena. Portanto, esse empenho se deu com imperadores, com papas, com ditadores e democratas, com dirigentes esportivos, com grupos organizados, e continuará como tradição cultural da sociedade.

Assim, imbuídos da necessidade de eternizarem seus feitos e seus personagens mais apreciados, os esportistas dos dois grandes clubes de futebol de Campinas escolheram o escultor Lélio Coluccini para dar aos seus sentimentos a forma de arte.

Muito se sabe sobre Coluccini, mas vale lembrar, aqui neste pequeno artigo, que o mestre nasceu na Itália, em 1910 e, aos dois anos foi trazido pelos pais ao Brasil, primeiramente para São Paulo. Pouco tempo depois, a família já dirigia a própria marmoraria em Campinas, onde o pequeno Lélio se revelou artista. E foi com o apoio familiar que, em 1924, Lélio voltou para a Itália e diplomou-se escultor no Instituto d`Art Stagio Stagi de Pietrasanta, em 1931. No seu retorno a Campinas ele trabalhou no ateliê da Rua General Osório, 752, até seu falecimento, em 1983. Suas principais obras são: Ninando a Boneca (Praça da República, São Paulo, SP); A Caçadora (Parque do Ibirapuera, São Paulo, SP); e Monumento ao Bicentenário de Campinas (Largo das Andorinhas, Campinas, SP).

Mas vamos às suas obras esportivas.

No Brinco de Ouro da Princesa, como é conhecido o Estádio do Guarani Futebol Clube, está o busto de Joca, o valinhense João Luiz Ungaretti, dos futebolistas bugrinos foi aquele que por mais tempo e com grande qualidade envergou a tradicional camisa verde, de 1918 até 1941. A escultura de Coluccini foi inaugurada a 2 de abril de 1956, cerca de três anos após a inauguração do Estádio. Trata-se de uma peça em bronze sobre pedestal de granito rosa apicoado, postado na parte fronteiriça do Estádio, situado na Avenida Imperatriz Dona Tereza Cristina, 11, Bairro Proença.

Se nos dirigirmos ao Majestoso, como é conhecido o Estádio da Associação Atlética Ponte Preta, veremos na entrada principal o busto do limeirense Moysés Lucarelli, o presidente do Clube que dedicou inestimável empenho  à construção do maior orgulho pontepretano, seu Estádio, inaugurado em setembro de 1948. Também esculpida por Lélio Coluccini, a obra em bronze está assentada sobre pedestal de granito rosa apicoado, e foi inaugurada a 11 de Agosto de 1960. O Estádio que leva o nome do ex-presidente está localizado na Praça Dr. Francisco Ursaia, 1900, Bairro Ponte Preta.

Pois bem campineiros, nesse Derby em que se disputou a arte de Coluccini nos estádios deu empate!

Mas não foi Lélio Coluccini, apenas, a deixar suas obras presentes nos estádios de futebol de Campinas. Domingos Nucci foi o escultor do busto de Horácio Antônio da Costa, o engenheiro de ferrovias macaense que se fixou em Campinas e se dedicou à construção do mais moderno complexo esportivo de sua época, o Estádio do Esporte Clube Mogiana, inaugurado em 1940. Portanto, alguns significativos anos antes das inaugurações do Majestoso (1948) e do Brinco de Ouro da Princesa (1953).

Fundado por funcionários da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, o Clube mandava seus jogos no Estádio da Rua Engenheiro Cândido Gomide, 196, Bairro Botafogo. O Tricolor mogiano nasceu pujante, mas não resistiu à crise financeira que assolou as empresas ferroviárias brasileiras e teve seu epílogo no final dos anos de 1960. Todavia, o governo do Estado de São Paulo tem mantido e disponibilizado a praça esportiva que hoje leva o nome de Centro Recreativo e Esportivo de Campinas Dr. Horácio Antônio da Costa (CERECAMP).

Diz o Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas (CONDEPACC) que o complexo ferroviário da Cia. Mogiana foi tombado como patrimônio histórico edificado, mas o Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas (IHGG Campinas), com o apoio fundamental de antigos funcionários e pesquisadores do Centro de Memória – Unicamp (CMU), protocolou um pedido de inclusão do Estádio e da Praça de Esportes como elementos de destaque de todo o complexo, que inclui a própria estação, escritórios, armazéns, residências funcionais e demais benfeitorias.

O busto em bronze de Horácio Antônio Costa foi esculpido por Domingos Nucci na oficina artística de cantaria e estuque de O. Papais e está assentado sobre pedestal de granito rosa apicoado, localizado na entrada principal do Estádio. A oficina artística funcionou primeiro na Rua General Osório, depois na Cônego Scipião, Irmã Serafina, Moraes Salles e, finalmente, na Rua Américo B. de Moura, no Bairro Taquaral. Nucci trabalhou praticamente toda a sua vida profissional em parceria com O. Papais. Dedicou-se a arte sacra e a produção de esculturas monumentais. Os bustos do reitor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Campinas), Monsenhor Emílio José Salim, do Cônego Nery e de Dom Bosco também foram de sua lavra.

As assinaturas de Lélio Coluccini, Domingos Nucci e O. Papais

Para finalizar esta pequena adição sobre a relação entre escultores e o futebol de Campinas, há que referenciar o busto do mineiro Carlos Alberto Silva, o técnico Campeão Brasileiro de 1978 com o Guarani Futebol Clube. Silva foi o comandante do maior feito de uma agremiação sediada fora das principais capitais do País. A obra foi esculpida pelo campineiro Octávio Teixeira Mendes Neto, em 2017.

Assentado em pedestal de granito cinza-claro apicoado, o busto de Carlos Alberto Silva foi inaugurado em 2018 e está localizado na entrada principal do estádio Brinco de Ouro da Princesa.

Referências documentais e bibliográficas:

ARQUIVO pessoal de Fernando Antonio Abrahão
ARQUIVO pessoal de Gilberto Gatti.
ELUSTA, Halima Alves de Lima. (2008). Visita ao museu de pedra: o Cemitério da Saudade de Campinas, SP. Goiânia, GO: Universidade Federal de Goiás. (dissertação de mestrado).
SANTOS FILHO, Lycurgo de Castro; PUPO, Celso Maria de Mello; CAMPOS JÚNIOR, Theodoro de Souza. (1974). Campinas em pedra e bronze: guia dos Monumentos e placas comemorativas de Campinas. Campinas, SP: Prefeitura Municipal de Campinas.

7 comentários

  1. Dentro do estádio Brinco de Ouro, no setor de “vitalícias”, há placas circulares de bronze com os rostos de José de Alencar e Antônio Carlos Gomes, também esculpidos por Lélio Coluccini e inaugurados um dia antes (30/05/53) do estádio.

    Curtir

    1. Fiquei surpreso com estas revelações sobre obras do meu pai que estão no Estádio do Guarani, confesso que só tinha conhecimentos do busto no Estádio da Ponte Preta. Parabéns a todos pelo belo trabalho de pesquisa.

      Curtir

  2. parabéns ótima postagem, não sabia que os bustos no Guarani e na Ponte era de Lelio, Parabéns Fernando Abrahão e Gilberto Gatti

    Curtir

  3. Fiquei muito contente de ver a bela reportagem sobre estes grande artistas escultores e suas obras. Muito orgulhoso de ver o nome do meu sogro, Domingos Nucci, pai da minha esposa Dirce Nucci Fonseca. Só alegria.

    Curtir

Deixe uma resposta