Maria Luiza Silveira Pinto de Moura* – escritora, pesquisadora. Patronesse da Cadeira 37 do IHGG Campinas e Décio Silveira Pinto de Moura* – escritor, psiquiatra.
Resumo:
Salvador Rosa teve grande êxito. Foi escrita em seis meses, como uma espécie de vingança porque a Fosca, tão caprichosamente elaborada, não foi bem aceita. Os italianos gostavam de cantarolar as árias das operas após assisti-las e Fosca era difícil de decorar. Salvador Rosa, tem a história ligada a Nápoles e tinha a melodia mais a gosto dos italianos da época. Assista ao vídeo no final.
Salvador Rosa (1874). Carlos Gomes’s Opera.
abstract:
The Salvador Rosa opera had great success. It was written in six months, as a kind of revenge because Fosca, so capriciously elaborated, was not well accepted. The Italians liked to sing the arias after watching and Fosca opera was hard to decorate. Salvador Rosa, more popular, has a history linked to Naples and had the most appreciated musical melody to the Italians taste. Watching the video at the end.
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Trata-se de ópera em quatro atos, libreto a cargo de Antônio Ghislanzoni, quem se baseou no romance Masaniello, de autoria do escritor Mirecourt. O enredo trata do pintor Salvador Rosa e se passa em Nápoles, em 1647. O artista estava em seu ateliê ocupando-se da pintura de um quadro e pergunta ao seu aluno Gennariello qual a opinião sobre a tela. Gennariello responde que o céu estava muito carregado, o mar estava tétrico e a fisionomia das damas estava mal. Salvador Rosa concorda com a opinião, mesmo porque estava apaixonado por uma senhorita e somente por ela se interessava, de forma que as mulheres do quadro tinham fisionomia semelhante. O aluno confessa que, também, tinha uma paixão a quem compôs uma serenata, o que surpreende o mestre. Gennariello canta então a ária Mia Piccirella.
Nesse momento chega o amigo Masaniello, quem afirma ter novidade a comunicar. Todavia somente a confidencia após a saída do aluno. O segredo consistia na notícia de que estava tudo preparado para um levante contra o duque D’Arcos, vice-rei espanhol considerado tirano. A revolta era popular.
O levante se daria ao meio dia e, ao contar a notícia, Masaniello confessa que seria desejável um acordo com o duque para evitar-se o derrame de sangue. Salvador Rosa concorda com a opinião. Aqui está colocado um dueto melodioso para o diálogo entre os dois amigos.
Retirando-se o visitante, o pintor fica novamente a sós, com o pensamento preso apenas na bem-amada, quem viu somente uma vez e nem lhe conhece a identidade. O devaneio foi, todavia, interrompido pela entrada do conde de Badajoz, quem se apresenta para convidar Salvador Rosa a comparecer à presença do duque. Aliás, pouco antes, o aluno voltara para convencer o pintor a fugir. Mas foi tarde. Diante do convite do conde de Badajoz recusou-se o pintor.
Badajoz dá ordem para que entre a escolta. A casa já estava cercada e assim Salvador Rosa é levado preso. Ele apenas teve tempo de pedir ao aluno que informasse Masaniello da sua prisão. Chegam à casa alguns discípulos do pintor e, diante da notícia da prisão, revoltam-se brandindo punhais e jurando lutar contra a tirania espanhola.
A segunda cena ocorre no grande salão do palácio de Vicária, onde trabalha o duque D’Arcos. Este deseja sufocar a revolta popular e confia a Fernandez essa missão, que no caso de bom êxito, será compensado recebendo a mão de Isabella, filha do vice-rei, em casamento. No caso de fracasso, D’Arcos fugirá para Castelnuovo, através de uma porta secreta do palácio.
Chega então à sala Salvador Rosa e a escolta. O pintor foi interrogado pelo duque, quem o acusa de conspirador contra o rei. Salvador retruca, afirmando que o povo se ergue por sofrer grande opressão. O pintor declara-se favorável aos oprimidos e ainda que o duque deve ouvi-lo no sentido de restabelecer os estatutos de Carlos V e de, rapidamente, suspender os tributos excessivos cobrados do povo.
O duque resiste a fazer as concessões sugeridas, por mero orgulho. Nesse momento entra à sala Isabella, filha do duque, logo reconhecida por Salvador como sua amada, o modelo que pintara. Isabella vinha pedir ao duque clemência para o povo. O duque resiste também ao rogo da filha, alegando que é seu dever lealdade para com o rei. Já de fora soam vozes que gritam morte aos espanhóis. Salvador mostrava algum desespero ao saber que a mulher amada fazia parte da nobreza, o que a tornaria infinitamente distante com relação ao seu amor.
A insurreição parece nesse momento que não seria controlada, motivo por que o pintor aconselha o duque que se ponha a salvo, usando a saída secreta e, como é natural, que se retire salvando também a filha. O duque por orgulho vacila, mas Salvador se propõe a ser intermediário diante dos subversivos, mais por paixão a Isabella.
Surge então Masaniello à frente dos revoltosos que adentram a sala. Salvador Rosa informa que o duque D’Arcos fugiu e que o palácio está desocupado. Com a vitória dos insurretos, termina o primeiro ato, com o povo bendizendo Masaniello.
O segundo ato se inicia com a primeira cena ocorrendo em sala em Castelnuovo, próximo a Nápoles, que serve de refúgio ao vice-rei, deposto pela revolta dos napolitanos. Na sacada, Isabella observa o movimento da rua e vê a multidão que se aproxima tendo à frente Salvador Rosa. Isabella pede ao pai que receba o pintor e que o aceite como mediador. O duque rejeita a sugestão de Isabella e ordena que ela se componha com mais ricas vestes e joias para breve, afirmando que dentro de poucas horas estariam novamente em Nápoles. Isabella ainda o interroga com respeito a terem sido aceitas as propostas de Masaniello. O duque lhe responde que os problemas de Estado a ele competem. Quanto a ela compete tornar-se bela para o encontro com o futuro marido. Isabella fica atônita e se retira deixando o pai a sós, quem estava contrafeito com o resultado da revolta e se põe em solilóquio, manifesto no libreto com a ária Di sposo, di padre, sem dúvida a página que atingiu a maior fama em toda a ópera.
À chegada da multidão ao palácio, D’Arcos aceita assinar a rendição e entrega-a a Salvador, mensageiro de Masaniello, ato em que se firmava a trégua e a revogação os tributos. Entra Isabella e Salvador se anuncia a ela como embaixador dos revoltosos e não esconde a surpresa ao ver que Isabella ficou satisfeita por ter o vice-rei atendido a todos os desejos dos napolitanos. Isabella mostrou ter reconhecido Salvador e este recordou que o conhecimento se deu quando ele pintava em Chiaia e ela foi observar o trabalho, retirando-se pouco tempo depois.
O diálogo entre ambos teve tempo e clima suficientes para que Salvador Rosa declarasse a Isabella a paixão que nutria desde àquele encontro em Chiaia. Declara, também, a decepção em saber que ela é filha do vice-rei, o que impossibilita a satisfação das suas aspirações. Isabella, entretanto, emociona-se, abraça-o e pegando um crucifixo, jura-lhe amor eterno, afirmando que seria dele ou haveria de morrer. Salvador Rosa demonstra grande emoção ao saber-se correspondido.
Entra o duque D’Arcos em companhia de alguns cortesãos. Pouco antes ouvira o juramento da filha e encolerizou-se. Mas, a ocasião exigia que dissimulasse a ira. Assim sendo, pediu a Salvador Rosa que desse o braço à duquesa D’Arcos e se dirigiram ao povo. Fitando ainda os dois jovens, não esconde o desejo secreto de eliminar o pintor e enviar a filha para um convento: A ela o claustro; para quem ousou tanto, a morte.
A segunda cena focaliza uma praia de Nápoles onde o povo festeja a vitória contra os espanhóis com o ballet apresentando a Tarantella, dança popular e tradicional da Itália meridional, bailada e cantada.
A palavra Tarantella deriva de Taranto, na antiga província de Apulia. Na era atual é uma música cuja melodia flui em maneira rápida e contínua. Em geral é dançada por casais de homem e mulher, mas também por pares de mulheres, e não raro os dançarinos percutem castanholas ou tamborim. A tarantela de Salvador Rosa contem alguma participação de coro, tem interrupção para a intervenção da cena e estrofe de Gennariello.
Trata-se de composição alegre, fluente e de bela melodia em que as alternâncias tonais permanecem em modo maior e que contém intermitente participação coral. No que respeita a ênfase, estão estabelecidos limites para a interpretação do piano ao fortíssimo, intensidade mais frequente para refletir alegria ao ballet muito festivo.
Masaniello discursa ao povo em uma tribuna improvisada. No palácio do vice-rei, a bandeira branca hasteada após a rendição. Gennariello, aluno de Salvador, com apenas quinze anos é considerado um dos heróis da revolta é convidado a narrar a participação no movimento.
Entre a multidão estavam bandidos, um dos quais o conhecido Corcelli, que participaram da insurreição e se queixavam de não lhes terem dado o direito a saquear a cidade, como recompensa. Masaniello foi aclamado rei de Nápoles, embora estivesse longe dele tal pretensão. O herói estava satisfeito com a justiça conseguida e desejava apenas a liberdade de continuar na atividade de pescador. Sob o anúncio da fanfarra, chegam os soldados espanhóis que desfilam na praça, olhados pelo povo com desconfiança, que logo se apaga com a entrada do duque ao lado de Salvador Rosa. O duque estende a mão a Masaniello, cumprimentando-o e abraçando-o, além de convidá-lo a fazer parte do governo.
Enquanto o povo demonstrava seu prazer, D’Arcos olha com desprezo, pois suas dissimulações servem apenas para ganhar tempo. Isabella e Salvador, vendo reinar tanta paz, têm suas esperanças novamente acesas com relação ao futuro e à realização dos seus sonhos. Encerra-se o segundo ato quando caminham para o palácio, o malicioso vice-rei e Masaniello.
O terceiro ato se inicia no terraço do palácio de Vicária onde uma festa é levada a efeito para celebrar o acordo do povo com a realeza. Em um dos cantos, com o diálogo entre Fernandez e Badajoz, fica-se informado de que ambos observam o resultado de um filtrado de veneno que Masaniello ingeriu oferecido pelo conde Badajoz. Corcelli e seus companheiros estavam servindo a Espanha. Salvador Rosa procura por Isabella e o conde lhe informa que a moça já estava reclusa em um convento. Tudo a mando do vice-rei duque D’Arcos.
Masaniello surpreende os convidados ao surgir ofegante e com as vestes em desalinho, proclamando-se rei de Nápoles. Muitos dos convidados começam a retirar-se diante desse comportamento. Salvador Rosa corre para Masaniello ao percebê-lo envenenado. Masaniello já não consegue ouvi-lo quando tenta avisá-lo de que foram traídos pelo vice-rei, ao lado de que lastima a destruição dos seus sonhos de amor.
Salvador Rosa deplora-se ao ver Masaniello em delírio julgando-se rei de Nápoles e encolerizado pela traição, acusa formalmente o duque pelo envenenamento do amigo e dispõe-se a enfrentá-lo em vingança. O duque lhe dá voz de prisão à qual ele se opõe. Entram soldados, Fernandez desembainha a espada para enfrentar, Salvador Rosa e é contido pelo próprio duque que ordena a Fernandez que desarme Salvador Rosa. Este quebra a espada no joelho e os convivas exigem punição para ele, considerando-o atrevido por ser plebeu.
Na segunda cena, Isabella entra no pátio do mosteiro não escondendo o desespero, e compara seu destino com o de uma freira que acaba de morrer vítima de um drama de amor. Soror Inez diz que todas vão orar pela freira moribunda de que foi recolhida ao convento para esquecer o seu amor. Isabella crê que, também, esse será seu futuro. Exprime seu desejo de que seus sofrimentos sejam levados pelo vento aos ouvidos do bem-amado, através da bela ária Volato, o libere aure dei cieli.
Ao chegar o duque, ouve-se dramático dueto entre pai filha, em que ela recebe proposta do pai para que receba a liberdade em troca do casamento com Fernandez e da salvação de Salvador Rosa. Isabella enfrenta a terrível opção imposta dizendo que prefere morrer, já que jurou eterna fidelidade de seu amor e tenta demover o vice-rei quem, todavia, é inflexível e afirma que esse homem morrerá se não o salvar. Promete entregar Salvador Rosa ao carrasco. Isabella em desespero cede.
O quarto ato tem o cenário dividido ao meio por um muro, que tem à esquerda os jardins do palácio e à direita um ângulo da igreja do Carmo. Gennariello canta sua serenata alegre dedicada à namorada e depois caminha em direção ao mar. O conde sai do palácio para a confabulação com os bandoleiros pagos pelo vice-rei, sobre a maneira de matar Masaniello, já que a dose de veneno não conseguiu êxito, dada a complexidade muito forte do pescador. Os bandidos entram na igreja das carmelitas. O coro dos bandidos é uma proclamação de defensores do reino; no outro coro, no palácio os cortesãos festejam os próximos esponsais de Isabella e Fernandez.
O conde dirige-se a Salvador Rosa comunicando a clemência do vice-rei e apontando a igreja, por onde deverá fugir. Isabella vestida de noiva, coberta por um manto, achega-se a Salvador Rosa e pede que fuja para não cair nas mãos dos carrascos. Salvador Rosa está preocupado com a notícia de sua liberdade, mas ao ver Isabella esquece a preocupação e ao reparar-lhe nas vestes, compreende que ela é agora esposa de Fernandez.
Isabella confirma ao amado que fora vítima do pai para poder salvá-lo. Implora o perdão de Salvador Rosa e este confessa que acreditará somente se ela estiver disposta a fugir com ele. Chega agitado Gennariello para avisar aos dois sobre o perigo que corre Masaniello dentro da igreja, e cercado de bandidos. Gennariello e Salvador Rosa correm para a igreja. Antes, ele insistia para que Isabella o acompanhasse, mas ao ouvir um tiro dentro da igreja, os dois amigos se precipitam para lá.
Pouco depois Isabella interpela o pai sobre quem ordenou a morte de Masaniello. Salvador Rosa retornando exclama: Teu pai! E com um punhal atira-se em direção do duque. Isabella se interpõe entre os dois e Gennariello o desarma, atira o punhal ao chão e amaldiçoa o duque afirmando que ele deve viver para sofrer os remorsos. O duque ainda ordena ao conde que mate Salvador Rosa. Isabella apanha o punhal do chão e se mata, mas em sua agonia pede a Salvador Rosa que viva para a arte para que seja glorificado, ao mesmo tempo que pede perdão ao pai.
Referência Bibliográfica:
MOURA, Maria Luiza S. Pinto de e MOURA, Décio Silveira Pinto de. Os ballets na ópera de Carlos Gomes. (s.d.). Ilustrações de Egas Francisco. Campinas : Cia. Aluminis. 62p. (pp. 23-30).
* In memoriam