Sensibilidades da quarentena: Saudades das caminhadas ao Centro Histórico de Itu

Quarantine feelings: I miss my walks to Historic Center of Itu (SP, Brazil).

Aline Antunes Zanatta – educadora museal no Museu Republicano “Convenção de Itu”, doutoranda na Faculdade de Educação – UNICAMP e correspondente do IHGG Campinas em Itu, SP.

Tenho saudades de caminhar entre as camadas dos tempos que resistem na paisagem, observando os prédios construídos pelos trabalhadores e seus saberes e técnicas.

Estar e criar no nosso Museu Republicano com tanta gente boa que percebeu que o museu é seu e pode habitá-lo. Ver as crianças pequenas virem uma vez, voltarem inúmeras outras, já grandes e investigadoras. Ajudar os visitantes a guardarem antes das visitas às exposições, suas lembranças compradas nas lojinhas dos exageros da cidade. Torcendo para que daqueles lápis gigantes saiam grandes ideias.

Exercitar a capacidade que o educador tem de compreender as mudanças do tempo e espaço, explicando com todo respeito aos mais idosos, já frequentadores antigos do nosso museu, o porquê mudamos ou retiramos alguns acervos dos lugares, mesmo correndo o risco de levarmos algumas bengaladas, dependendo do grau de parentesco destes com as famílias quatrocentonas da estância turística de Itu.

Encontrar-me semanalmente com o grupo mais fantástico de bordadeiras do mundo, chamado Utuguassú, à sombra do nosso pé de pitanga, no museu. Lugar em que elas habitaram para que suas memórias individuais fossem compartilhadas e tramada uma rede chamada memória coletiva.

Experimentar um sorvete artesanal de frutas e ervas na praça do Carmo, do Nirulas.

Beber uma breja com as amigas e amigos no bar do Farias, ali no bar da esquina, que a gente nunca encontra uma mesa e cadeira para sentar, mas sempre um amigo para prosear.

Tomar um café da Bebel, ou melhor, no café Gamela, acompanhado de doce caseiro. Sentindo já o aroma do café moído ao longo da calçada.

Comer cachorro-quente das esquinas da praça Matriz, cada canto tem seus encantos, mas é irresistível o capricho do Jabá.

Escutar o tradicional grupo da fofoca na lanchonete Tonilu (valendo contos do século passado…), enquanto como um maravilhoso pastel frito na hora e aproveito para observar fotos antigas da cidade, que estão expostas nas paredes do lugar.

Encho os olhos com a raspadinha colorida do coreto da Praça da Matriz Nossa Senhora da Candelária, porque o carrinho fica lindo ao lado do coreto e tem gosto de verão, de céu azul e da cidade iluminada.

Ficar me segurando para não comer os churros ali da esquina da Matriz e toda a doceria da cidade, feita e herdada das famílias, do convento, do mercado, dos tachos das fazendas.

Visitar minhas amigas artesãs da feirinha do Carmo, em especial, a minha querida amiga Natalina Pereira e sonhar com o samba de bumbo acordando novamente, depois de anos silenciado, com toda força ancestral e vibrante que faz ecoar a luta de um povo que constrói a cidade com as suas mãos.

Ver a cidade de perto, em movimento, respirando, questionando. Digo isso porque agradar ituano é algo dificílimo, depois que receberam o agrado do tal título de Fidelíssima do Imperador.

Temos saudades da vida, do nosso passado presente.

Neste sentido, o isolamento e distanciamento social pode ajudar a lembrarmos que o chamado Centro Histórico é, ao mesmo tempo, o centro do comércio, do trabalho, dos bancos, local da corrida diária onde nunca se tem tempo para olhar a configuração da paisagem, ver a cidade e reconhecê-la como sua.

Por outro lado, a cidade é nossa e histórica exatamente nestas sobreposições, na trama da vida que vai além dos limites do chamado Centro Histórico, no movimento de seus habitantes no território. Sentimos falta da cidade com rostos, cheiros, gostos e sons.

Por enquanto, só da janela de casa.

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