Prefácio de: Crimes e criminosos da Campinas cafeeira: 1880-1930

Preface to the: Crimes and criminals of Campinas coffee economy (SP, Brazil): 1880-1930.

Agostinho Toffoli Tavolaro – advogado, professor. Titular da Cadeira 39 do IHGG Campinas.  

O se debruçar sobre a história de um período, concentrando-se sobre seus aspectos peculiares e sobre fatos e pessoas dos quais se tem visões e versões díspares é tarefa árdua e complexa que do historiador exige, além da pesquisa de documentos, relatos e sua inserção no contexto local e nacional, quando não também no das nações, qualidades de discernimento, sobriedade e isenção que estão jungidas às concepções que dessa ciência e arte, a História, tem o estudioso.

Caso o historiador tenha uma concepção de história como narrativa simples de acontecimentos no mundo fáctico, sem se preocupar com suas causas, resultados ou repercussões no círculo vital em que se situam, será um mero fotógrafo de uma realidade (quando realidade for) vista do ângulo em que se posiciona, sem qualquer preocupação com a adoção de processos metodológicos.

Se pender o estudioso pela visão pragmática, sua exposição dos fatos tenderá a orientar os princípios da vida em comum e do estado, apontando erros do passado e sugerindo medidas para que se não repitam, visão esta da história que têm como expoentes, na antiguidade grega Heródoto e Tucídides, na romana Papiniano e Cícero, este para quem a História é a mestra da vida.

Preocupado o historiador com a verdade e com uma concepção científica da História, irá buscar explicações sócio-econômicas na origem e no desenvolvimento dos eventos, lastreando-se na visão marxista da luta de classes, ou na doutrina social da igreja, ou na visão capitalista do mundo, deslembrando-se de que o homo sapiens é um animal que se deixa levar pelas paixões e se deixa influenciar pela avassaladora pressão midiática que o aliena e o distancia de sua própria natureza.

Na verdade, a obra de Fernando Antonio Abrahão, Crimes e criminosos da Campinas cafeeira: 1880 – 1930 (Volume inaugural da Coleção Memória de Campinas), nos mostra que soube ele fazer uma análise factual e conjuntural que o situa acima das concepções unilaterais da história, evidenciando uma laboriosa pesquisa com metodologia científica, sem olvidar as raízes na sociedade do período examinado, fruto de uma formação histórica que observa as transformações do advento da cultura cafeeira e a industrialização que dela surgiu, efeito do influxo da economia mundial e da finalização do período escravagista, aliados ao movimento das imigrações europeias de profunda significação na vida paulista, bem como o fenômeno da urbanização que hoje atinge seus píncaros, quando vemos a concentração de nossa gente na cidade, colocando Campinas como metrópole e centro cultural.

Encontrará ainda o leitor a moderna tendência dos estudiosos da História, desenvolvida a partir da segunda metade do século passado, de utilizar nas suas análises o método estatístico, que embora necessite de cuidado analítico, como frisou o autor, dá ao conjunto de apreciações da realidade diuturna que o historiador garimpa em sua árdua tarefa de buscar uma visão mais ampla do panorama que se lhe apresenta.

Perlustrando com didática exemplar os estudos sobre crimes e criminosos, a partir de Dos delitos e das penas, de Cesare Beccaria e passando por Lombroso, Durkheim, Nina Rodrigues, Robert Merton, Abrahão vê um amplo conjunto de atos de natureza criminal no período – crimes sexuais, homicídios, furtos e roubos -, procurando lhes averiguar causas e razões, ao mesmo tempo em que se detêm no exame do aparato policial, judicial e particular dos réus e das vítimas – cor, nacionalidade, idade etc. -, tendo em vista sua repercussão no meio social, bem como o efeito das prisões e das penas aplicadas.

Laborando com o extenso material reunido no Centro de Memória da Unicamp, com os arquivos judiciais ali em boa hora preservados, suscita Abrahão quer no leitor leigo, quer no especializado (sociólogo, historiador, jurista, policial ou legislador) reflexões sobre a criminalidade em geral, tendo o cuidado de ser fiel à lição de Gregório Marañon de que a história não se faz somente com dados, mas também com interpretações, ao propor a sua perspectiva dos fatos e dados narrados.

Apresentada a presente obra, em sua primeira versão, como dissertação de Mestrado ao Departamento de História do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP, coloca à mostra a história que se perderia nos recônditos dos escaninhos universitários, pois, como escreveu Pierre Daninos, são os fatos do dia que fazem a história, mas são as palavras do dia seguinte que a escrevem. É assim, de necessária e imprescindível consulta a todos quantos busquem conhecimento do evolver da criminalidade.

Referência bibliográfica:

ABRAHÃO, Fernando Antônio. (2018). Crimes e criminosos da Campinas cafeeira: 1880-1930. Campinas: Pontes Editores e IHGGC. Volume 1 da Coleção Memória de Campinas. 148p.

Para adquirir: http://www.ponteseditores.com.br / Livraria Pontes: Rua Dr. Quirino, 1223 – Centro, Campinas – SP, 13015-081 / fone: 19-3236-0943.

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